quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Cenas que a vida ensina e a arte encena



São famosas, na família, as histórias do meu avô Camilo, descendente direto de imigrantes italianos. A família veio do norte da Itália diretamente pra trabalhar nas lavouras de Minas Gerais no final do século XIX.

Meu avô e os irmãos já nasceram no Brasil, com exceção de uma menina, a primogênita, que nasceu e morreu  no navio, durante a viagem ao Brasil e, como de costume na época, foi jogada ao mar.

Vários filmes retrataram com exatidão essa cena mas nos emocionamos muito ao assistir os primeiros capítulos da novela Terra Nostra quando a criança nascida no navio e morta em função de doença, é jogada ao mar.

Como diz o título do livro de Márcia Luz: “ Lições que a vida ensina e a arte encena.”
 
A história comprova que não foi nada fácil a vinda e permanência dos emigrantes no Brasil, especialmente a dos italianos que vieram em grande número, a maioria pra trabalhar nas lavouras de café de São Paulo e Minas.

Apesar da emigração dos italianos ter sido incentivada e subvencionada  pelo governo brasileiro,que pagava suas passagens,o que eles encontraram  no Brasil foi  uma realidade de trabalho dura e semi escrava, bem diferente da propaganda divulgada na Itália, entre o povo italiano. Alguns fazendeiros inescrupulosos cobravam todas as despesas de viagem, e prorrogavam a sua dependência.

A nacionalidade que mais imigrou para a América Latina foi a italiana, superando os espanhóis e os portugueses, , tendo como ápice a faixa de tempo entre os anos de 1880 e 1930.   Dos 11 milhões de imigrantes que foram para a América Latina, 38% eram italianos, 28% eram espanhóis e 11% eram portugueses.

A crise na Itália, em função das guerras de unificação, intensificou as desigualdades sociais e demográficas, obrigando o pequeno camponês,sem condições de viver da própria terra a buscar outros países. 

Que entendeis por uma Nação, Senhor Ministro? É a massa dos infelizes? Plantamos e ceifamos o trigo, mas nunca provamos pão branco. Cultivamos a videira, mas não bebemos o vinho. Criamos animais, mas não comemos a carne. Apesar disso, vós nos aconselhais a não abandonarmos a nossa Pátria? Mas é uma Pátria a terra onde não se consegue viver do próprio trabalho?
Fala anônima de um italiano para o Ministro de Estado da Itália

O Continente Americano aparece, em função dessa crise, como um destino sonhado por milhões de europeus, que imigravam com a promessa de se tornarem grandes proprietários agrícolas.
O povo italiano apesar das dificuldades fixou-se na terra e misturou-se ao povo brasileiro e moldou em grande parte a nossa cultura, juntamente com a portuguesa, a dos negros e índios e ainda  realizou, em parte, um dos objetivos do governo brasileiro encontrado em registros públicos da época que buscava, com a imigração , especialmente a italiana,  “embranquecer”  o povo brasileiro.

...............

Meu avô Camilo e seus irmãos fizeram a sua parte, porque todos  se casaram com mulheres mestiças.  

A verdade é que a dureza da vida na lavoura e a frustração devem ter moldado a criação dos filhos e do meu avó em particular, que com isso construiu um temperamento bem dificil. Não são raras as histórias pitorescas ocorridas com os filhos, que ele tratava “ com casca e tudo” , como diz minha mãe.

O meu avô Camilo rejeitava suas origens. Nascido como Camilo Victalli Carafolli Cavezolli ,  filho de José Cavezolli e Cecília Carafolli, ao se casar com a minha avó oficialmente no cartório, mandou  que tirasse a “carafolada” toda de seu nome e adotou o sobrenome da minha avó, e passou a se chamar Camilo Vital da Silva.

Infelizmente quase nenhum neto chegou a conhecer o avô Camilo. Como era de pouca conversa com os filhos, pouco se sabe portanto de sua história. O que sabemos foi por narrativas da minha avó Lucinda.

Minha mãe lembra vagamente da avó Cecília que vez por outra aparecia pra visitar. Vinha de vestido típico, preto,  todo bordado na barra  e enxotava os netos quando queriam se aproximar com medo que sujassem sua roupa. Ela não era nada fácil.


Camilo e Lucinda - Aventuras em série

Nenhum comentário: