Cenas que a vida nos faz encenar
Cheguei
ao escritório no horário marcado, era o primeiro dia de trabalho como gerente
de recursos humanos daquela empresa. Tinha passado um ano fora do mercado e apesar
da oportunidade de dar uma parada, após intensos 10 anos de trabalho na mesma
empresa, não foi nada fácil.
Ainda
em Petrópolis, o tempo sem ocupação foi bom pra estreitar a relação com os
filhos, a casa, os cachorros e, junto a todo aquele verde e frescor, um momento
precioso também para reflexão e meditação, embora os filhos insistiam em dizer
que passei mesmo foi por uma sonoterapia. Tá certo que depois de longas horas
de meditação, eu realmente acabava dormindo, mas a situação sempre foi motivo
de piada, e continua sendo até hoje quando nos recordamos de Ivone, nossa
empregada na época. Ao atender o telefone, ela sempre dizia:
-
Sua mãe não pode atender o telefone agora, ela está meditando.
A
demissão, que ocasionou os longos períodos de meditação, chegou de forma
inesperada, apesar dos sinais evidentes. A reação imediata foi acionar alguns
contatos pessoais e profissionais cultivados até então e avisar sobre a “disponibilidade” para o mercado,
antes mesmo de curtir as férias que já estavam agendadas, com apartamento já alugado.
E, realmente, os primeiros contatos para
entrevistas de trabalho surgiram exatamente nesse período. De férias na praia, a
rotina era sair da cidade praiana, participar das entrevistas e retornar. O
movimento era bom e parecia que as coisas não iam demorar mesmo muito tempo pra
acontecer...
A
primeira grande entrevista surgiu através de uma consultoria conceituada , para
uma posição em empresa francesa. Como o perfil tinha sido bem avaliado e altamente recomendado cheguei com segurança,
caprichei na apresentação, cabelo, roupa: “Tudo em cima”, pensei.
A
secretária anunciou minha chegada. A entrevista, inicialmente com os diretores
comercial e industrial transcorreu muito bem. A conversa com o presidente, ao
final, foi extremamente agradável. Ele perguntou sobre quase tudo, experiências
passadas, pediu opinião sobre diversos assuntos, falou também sobre sua
trajetória, história da empresa. Houve
empatia, afinal. Saí de lá com aquela sensação agradável de que, se não
acontecer de ser escolhida, valeu a pena ter vindo até aqui.
“Cumpridas
as recomendações técnicas, a empatia faz
toda diferença para um acordo de parceria, seja ele qual for. Em um processo
seletivo, isso vai fazer toda a diferença na hora de decidir por alguém” – é minha opinião.
Mas
a probabilidade, por mais favorável, nem sempre se cumpre como os cálculos
indicam. Esta questão ficou mais clara ou melhor compreendida depois que li o
livro Cisne Negro , ou Black Swan, de Nassim Nicholas Taleb (recomendo a
leitura).
Nassim Nicholas Taleb define no livro que cisne negro
é um acontecimento improvável e que, depois do ocorrido, as pessoas procuram
fazer com que ele pareça mais previsível do que ele realmente era.
No livro, o autor escreve que é impossível tentar antecipar e prever o futuro, já que
aquilo que conhecemos é muito menor em relação ao que não conhecemos. Ele
também explica como uma pessoa deve lidar com eventos inesperados em um mundo
imprevisível e que elas tenham a consciência e aceitem que esses eventos, uma
hora ou outra, acontecerão. (Wikipedia)
Passadas
algumas semanas, e só após fazer contato com a consultoria, chegaram as notícias
de que o processo tinha sido interrompido.
- “Não entramos em contato antes porque também
aguardávamos um posicionamento da empresa mas, parece que aconteceram mudanças na
empresa, mudança de diretoria”, desculpou-se a consultora, “não sabemos
exatamente o motivo”.
Mas
como dizem, o tempo é o senhor de todas
as coisas ... e, afinal, tinha sido só a primeira entrevista. Assim, consolei
a mim mesma.
Retomada
a nova rotina em casa, ligada na internet, estabelecendo contatos, buscando
alternativas (e meditando...). Foi quando outra renomada consultoria fez
contato, para uma posição de gerente de recursos humanos, em uma empresa
multinacional francesa, de grande porte. À essa altura, você já deve
imaginar que empresa era essa não? Pois
é. Só soube que era a mesma empresa
quando a entrevista foi agendada, mesmo local, porém com nome de diretor
diferente.
A
mesma secretária me encontrou na recepção, cumprimentamo-nos, o seu sorriso foi
uma demonstração de reconhecimento e surpresa. Estranho, pensei.
Encaminhada
para uma sala, aguardei a chegada do diretor financeiro, que aparentava no máximo uns 40 anos, bem mais jovem
que o anterior.
-
“Bom dia”, disse, sorrindo e carregando alguns papéis, logo no início da
entrevista. “Vejo aqui que você já participou do processo anterior”
-
“Bom dia. Pois é, não entendi muito bem, eu avisei pra consultoria sobre isso logo
que soube, quando a entrevista foi agendada, como não houve espanto, entendi
que era continuidade do processo anterior”
-
“É verdade, vi aqui que você foi indicada pela consultoria X e, não sei se tem
conhecimento, mas você foi a candidata selecionada naquele processo”.
-
“Fui? Não sabia...”
-
“ Mas, em função das mudanças, o processo foi interrompido porque trocamos o
presidente e os diretores anteriores, mas eles tinham escolhido você. “Agora”, e aí ele riu, nem mesmo acreditando em
si mesmo, “você foi novamente selecionada”.
-
“Muito bom saber disso. Mas, isso é bom ou ruim?”, perguntei.
-
“Pra você, acho que muito bom”, ele
disse, “afinal ser selecionada por duas grandes consultorias... isso te
coloca um passo à frente, concorda?”
-
“É, isso é bom”, disse, mas na verdade não era bem assim, pensei.
Passei
novamente por uma rodada de entrevistas. Dessa vez saí de lá com uma sensação
muito ruim. “Devia ter recusado”,
refletia.
Depois
de algum tempo de espera, a resposta chegou. E, é claro, não fui escolhida.
Não
ser a melhor opção para uma empresa não é o fim do mundo em uma situação
normal, faz parte de quem está participando de processos seletivos. A seleção é
dos dois lados, o candidato também deve avaliar o perfil da empresa, se ela se
encaixa nas suas expectativas.
Esse
processo especificamente ficou mal resolvido.
A minha visão da empresa, ao sair do segundo encontro, foi completamente
diferente da imagem que fiz no primeiro momento. Natural que tenha deixado um
gosto amargo.
Felizmente
houve oportunidade de esclarecer um pouco mais os fatos, com a consultora,
alguns dias depois.
A
situação foi embaraçosa pra todos. Os novos diretores simplesmente não sabiam
do processo anterior, tomaram conhecimento disso somente porque a secretária
lembrou de comentar quando me reconheceu.
Pode?
Pode! Teoricamente não, mas o mundo
corporativo está repleto de cenas como esta. Depois, como explicar a
contratação de uma nova consultoria pra um processo que já tinha sido
finalizado? E o pior, pra contratar a mesma pessoa que tinha sido escolhida
anteriormente. E ainda, pelo diretor anterior, que foi destituído. Como
justificar o custo envolvido?
De
minha parte acrescento ainda a displicência da consultoria em não ter apurado
melhor o fato, quando mencionei que já tinha estado lá. A consultora confessou também seu embaraço com
a saia justa. E até rimos da situação
–
Faltou originalidade ou meu currículo é realmente excepcional? Ou só eu estava
disponível por aqueles dias? Brincamos, na época.
De
minha parte, avalio que só deveria ter ido após os fatos devidamente
esclarecidos. Não cabe deduções, é importante trabalhar com dados de realidade.
Lembrando a questão do inusitado acontecer, estar qualificada nem sempre
trabalha a seu favor.
Ainda,
devo acrescentar o fato não menos importante de simplesmente não ter havido
empatia.
***
As
histórias da vida corporativa me inspiram a realizar o trabalho de coaching e orientação
profissional. Além da inspiração e experiência direta com as pessoas no mundo
corporativo, busquei formação sólida no tema e me especializei. Você pode entrar em contato comigo. Deixe seus
dados de contato, demonstrando qual o seu interesse e retornarei para falarmos.
Independente disso, podemos conversar. Estou disposta a ouvir a sua história e
contribuir, de alguma forma.
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