quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Beauty World - em Cenas do Cotidiano


Cheguei em Duque de Caxias, baixada fluminense, pela primeira vez diretamente de Petrópolis, em um ônibus da Única. Desci na Rodoviária, se é que poderíamos chamar aquele ponto final de rodoviária. Era um local no final de uma rua, onde os ônibus paravam, no meio de tantos outros. Passei por entre aqueles corredores de ônibus em filas sem fim, que se misturavam aos vendedores ambulantes. Todos falavam alto e o calor era insuportável. E, como não chovia ha alguns dias, a poeira se espalhava pelo local.


Estranhei. Nunca tinha visto um lugar como aquele. Fiquei impressionada. Muitos anos depois ,fui trabalhar em Caxias e muitas coisas mudaram e para melhor. Mas aquele era o ano de  1990  ou algo próximo disso.  E era outono mas  na Baixada nessa época, o calor já era abrasador.  


Com um endereço em mãos e após vencer aqueles primeiros obstáculos, saí perguntando a um e outro os caminhos até conseguir chegar ao local indicado. A “amiga” que me convenceu a ir neste encontro, me falou maravilhas sobre os produtos cosméticos que seriam apresentados. Tratava-se de uma linha que chegara recentemente no Brasil.


Resisti bravamente enquanto pude aos seus convites insistentes para que eu ao menos, fosse a uma reunião para conhecer, sem compromisso. Estranhava o seu discurso, cada vez mais obsessivo. Morava em Petrópolis, ela no Rio mas a distância não impedia que ela me ligasse diariamente:


-  Já decidiu, Teresinha?  Olha só , vai ter uma reunião em Caxias, dia tal, fica mais perto pra você, nem precisa ir de carro, me disseram que é perto da rodoviária. Você vai adorar!


Como não tive coragem de dizer não e estava realmente de bobeira naquele dia, eis que me vejo em Caxias no tal endereço.  Muito antes de chegar ali eu já estava arrependida.


 – Meu Deus, o que eu to fazendo aqui? Falei baixinho comigo mesma.


 Subi as escadas. Era uma pequena  sala no segundo andar de um prédio mal acabado, espremido entre uma agência bancária e um comércio.


 – Por que não vou embora? pensei.


O casal  parado logo na entrada sorriu pra mim, desejou-me boas vindas e  me entregou uns folhetos


Observei que só tinha uma porta.


- Vou ficar sentada aqui atrás pra poder sair logo, pensei.


A sala estava organizada com diversas fileiras de cadeiras brancas de plástico e um outro casal, também com sorrisos tatuados no rosto postavam-se  naquilo  que poderíamos chamar de palco.  Ele vestia terno e ela um vestido social com sapatos de  salto. Cabelos indefectíveis.


Em pouco tempo a sala ficou cheia de gente  e eu fui percebendo que meus planos de sair disfarçadamente não iam dar certo.


Vários casais deram seus depoimentos de que a vida deles mudou depois que conheceram a Beauty World. Suas palavras  me remetiam a  algum discurso messiânico, a uma seita divina ou iluminação milagrosa. Nas telas, fotos de casais americanos com seus filhos e suas casas,  prósperos e felizes. O paraíso. A fonte da riqueza e da prosperidade.  Tudo isso graças à  família Beauty World.


No discurso procurava-se convencer  aos presentes de que a venda daqueles produtos também poderia lhe proporcionar aquele padrão de vida. Claro que para isso bastava comprar o kit de produtos por tantos dólares,  um pequeno investimento inicial e a partir daí, o produto se vendia por ele mesmo...


Fiquei tão incomodada com aquele discurso e, me sentindo cada vez mais pressionada, me levantei pra ir embora.  Assim que me levantei, a expositora, hipnotizada e desesperada por resultados, gritou, antes mesmo que eu chegasse a porta:


- Como é seu nome?, perguntou histérica.


- Teresinha, respondi, querendo sair correndo dali.


- Uma salva de palmas para ela, senhores.


E fui amplamente aplaudida, de pé, ali no meio da sala.


- E você vai optar por ser uma representante ou uma divulgadora? – perguntou.


Pensei em explicar que na verdade eu me levantei pra ir embora, mas  diante de tantos aplausos, fiquei sem palavras. Tímida, estava desesperada pra ir embora.


“Divulgadora”, falei entre os dentes, pra que eu mesma não pudesse ouvir minhas próprias palavras. Tentei me apegar ao que menos comprometia.


- Parabéns Teresinha!! Seja bem vinda à família Beauty World! 


Nem pensei muito,  agradeci meio sem graça e  e saí da sala com a cabeça baixa, sem explicação  mas sob aplausos efusivos.  Acho que depois da minha iniciativa, várias pessoas se levantaram pra também entrarem na família Beauty World. Eu aproveitei o momento e desci as escadas  e não olhei pra trás. A sensação era de que alguém correria atrás de mim pra eu formalizar um contrato.


-----------


Logicamente isso virou mais uma piada de família e essa cena já foi encenada lá em casa várias vezes. Sempre rimos muito.


Logo em seguida, a tal amiga parou de vender e falar no assunto. Não ficou rica, como esperava.


Mais tarde tomei conhecimento de outras redes de  produtos que  também utilizavam esse mesma tática  do milagre econômico,  já que algumas pessoas bateram à minha porta com o mesmo discurso hipnotizado. Antes de abandonarem esse caminho investiram algumas economias. Nenhuma delas ficou rica.


Porém, longe dali alguém com certeza enriqueceu.

Nenhum comentário: